A letra mata? Teologia esfria o crente? Não é útil? - Conhecimento #2

Devido ao post anterior da série conhecimento, alguém poderia ter levantado algumas dúvidas bem comuns. Então, esse post será uma espécie de Perguntas Frequentes a respeito do conhecimento de Deus. Mesmo temendo escrevê-lo, julguei necessário para podermos avançar com a série.

1. A letra mata?
A ideia aqui é que o exame da Bíblia impede a Salvação. Bom, esse é um argumento já batido, uma vez que muitos já mostraram o real sentido da passagem (2Cor 3.6). Uma leitura sincera da passagem mostrará que a Letra se refere à Lei mosaica. Isso fica explícito no versículo 7, onde Paulo se refere à Lei como "ministério de morte" trazido em glória por Moisés.  Sim, ministério de morte, pois mesmo a Lei sendo boa e santa (Rm 7.12), ela me traz morte (Rm 7.10) porque ela ressalta o meu pecado (Gl 3.19). Não se trata então de que a "letra" da Bíblia e seu estudo "matam".

2. Teologia esfria o crente?
É um posicionamento bem semelhante ao anterior, mas decidi separá-lo. Aqui, a ideia é de "esfriamento" espiritual, semelhante a um fariseu, mas não um afastamento definitivo. Afinal, é o Espírito que vivifica. Mas esse ponto de vista também não é bíblico. Em Atos 18.24-26 vemos Lucas apresentar Apolo como um homem culto, conhecedor Escrituras. O resultado desse conhecimento foi uma pregação corajosa. E o interessante é que ele ainda não conhecia o batismo no Espírito! Mesmo assim, a passagem traz o conhecimento de Apolo como algo bom, prático e impulsionador.

O Salmo 119 está repleto de poesia acerca da busca do conhecimento das Escrituras, mas você não pode negar o fervor dos versos. Pelo contrário, no versículo 7 o salmista diz: "Eu te louvarei de coração sincero quando aprender as Tuas justas ordenanças".

John Stott sabiamente diz:

"De fato, a disposição mental para compreender, a humilhação de si mesmo perante Deus são sinais do ardente desejo de quem quer alcançar verdade divina. Tal desejo certamente será satisfeito." [1]

3. E onde fica a fé nisso tudo?
Alguém pode questionar se a busca pelo conhecimento de Deus excluiria a fé em Deus. Essa é uma dúvida resultante de uma distorção do conceito de fé. A fé necessita de um conhecimento prévio do objeto que se crê. Veja bem: você pode até crer que o coelho da páscoa existe, mas antes, você precisa ser apresentado à lenda do coelho primeiro. Só então pode crer ou não crer. Paulo deixa bem claro isso em Romanos 10.14, quando diz: "como crerão naquele de quem não ouviram falar?"


Outros posts da Série:

Precisamos conhecer a Deus através de Jesus Cristo. Precisamos conhecer a natureza do nosso Deus, Seus santos atributos e Suas promessas. Só assim podemos ter esperança e compreender a realidade criada (Hb 11.1-3). O exame das Escrituras nos preserva em Santidade (Jo 17.17) e nos preserva no caminho (Sl 119.130).

4. A teologia não é útil para a vida cristã
Será mesmo? Depende da teologia que você conhece. O sermão do Heber Campos Jr traz um paralelo bem interessante entre Jonas e Davi [2]. O primeiro tinha um conhecimento sobre Deus que lhe permitiu dizer: "Eu sou hebreu, adorador do Senhor, o Deus dos céus, que fez o mar e a Terra" (Jn 1.9). A reação dos seus companheiros de viagem foi mais sensata que a de Jonas. "O que você fez?", indagaram. Afinal, se o Senhor fez o mar, por que você foge dEle no mar? A resposta é que o conhecimento de Jonas acerca de Deus que não lhe permitiu ser sensato. Coisa que os descrentes do barco imediatamente entenderam. Davi também entendeu. Ao entender o poderio de Deus, Davi logo anuncia: "Para onde eu fugiria da Tua presença?" (Sl 139.7-11).

J. I. Packer faz uma boa distinção entre conhecimento sobre Deus e conhecimento de Deus. Ele afirma:

"Como podemos transformar nosso conhecimento sobre Deus em conhecimento de Deus? A regra é simples, mas rigorosa. Devemos transformar cada verdade aprendida sobre Deus em assunto de meditação diante de Deus, conduzindo-nos à oração e ao louvor a Deus. (...) Meditação é o ato de trazer à mente as várias coisas conhecidas sobre os procedimentos, as peculiaridades, os propósitos e as promessas de Deus; pensar, deter-se nelas e aplicá-las à própria vida." [3]

O conhecimento de Deus deve servir para a prática (Jo 13.17) para a obediência (Sl 119.33-34), para a Salvação (Jo 17.3; 2Tm 3.15)! Sua Palavra é viva e eficaz (Hb 4.12) e apta para o ensino, para que o homem esteja preparado para a boa obra (1Tm 3.16).

5. É a sua opinião
Esse é o argumento mais frágil que listei, mas bem comum em qualquer roda de conversa. Bem, as Verdades bíblicas são eternas e absolutas; não há espaço para diversas opiniões como se existissem várias opiniões válidas. Isso é relativismo e não compactua com a fé cristã.

Se você disser: "essa é a sua interpretação" fica melhor. Sendo adepto dessa posição, cabe a você ser tão nobre quanto os bereanos e examinar as Escrituras para ver qual a posição bíblica correta (At 17.11-12), crendo ou trazendo a correta interpretação. Acusar o outro de má interpretação sem trazer a correta é o mesmo que prender o ladrão sem provar o crime.

"Esta é a minha oração: que o amor de vocês aumente cada vez mais em conhecimento e em toda a percepção, para discernirem o que é melhor, a fim de serem puros e irrepreensíveis até o dia de Cristo, cheios do fruto da justiça, fruto que vem por meio de Jesus Cristo, para glória e louvor de Deus". (Fp 1.9-11)

Referências

[1] STOTT, J. R. W. Crer também é pensar. 1ª edição. Editora ABU, 1972.
[2] Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=UcA01_rK3cw> Acesso em 05 de Maio de 2017.
[3] PACKER J. I. O conhecimento de Deus. Editora Cultura Cristã, 1973.

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