O amor do Pai; o justo Deus

Flick: Ricardo Camacho
Eu tenho a opinião que a música sacra tem que ser bela. Claro, como já falei no post sobre música gospel, é imprescindível que ela seja centrada na Bíblia e na figura do Senhor. Mas não é por isso que ela tem de apresentar somente paráfrases das Escrituras, correndo o risco de que seus versos se tornem mecânicos, isto é, sem a suavidade da poesia.

Não é o caso da canção que vou apresentar. Apesar de ter versos curtos (o que normalmente me passa a sensação de um discurso duro, sem coesão), ela apresenta as verdades cristãs de forma belíssima e profunda. Por sua linguagem poética, ela nos faz meditar em detalhes da Salvação, que, como diria Roberto Carlos, "são coisas muito grandes pra esquecer".

Sim, há canções excelentes sendo feitas ainda hoje para entoarmos em nossas comunidades. "Quebrantado", do Ministério Vineyard é uma dessas.

Eu olho para a cruz / E para a cruz eu vou / Do seu sofrer participar / Da sua obra vou cantar
Meu salvador / Na cruz mostrou / O amor do pai / O justo Deus [1]

O início dela me lembra o hino "Rude Cruz", mas o foco aqui é a obra redentora de Cristo. A música já começa bem porque o autor declara que, ao meditar na obra da cruz já deseja anunciá-la. Não tem uma introdução "lenga-lenga". A segunda estrofe na versão original, em inglês (é, eu também descobri agora), mostra o porquê do desejo de anunciar as boas novas de Salvação:

Porque nela meu Salvador foi machucado e esmagado / Mostrou que Deus é amor / E que Deus é justo

Mas é na tradução tupiniquim onde surge a frase mais estonteante da música: "O amor do Pai; o justo Deus". Pra mim, esse paralelo é fantástico! Eu já falei aqui sobre ele em "A matemática, a Salvação e o jeitinho brasileiro". Agora, o que eu quero mostrar é que diferente de outras canções melodramáticas sobre a crucificação, aqui o autor fala de justiça. Ele sabe que o amor foi a força motriz do sacrifício do Senhor Jesus, mas não esquece que seu pecado foi a causa. Falar do Evangelho sem mencionar o pecado é esvaziar o significado da boa nova. Como chamar o ímpio ao arrependimento sem evidenciar sua falta? Como falar de justiça se não há infração? Como falar de Salvação se não há cativos?

O hino passa para o refrão:

Pela cruz me chamou / Gentilmente me atraiu / E eu, sem palavras, me aproximo / Quebrantado por seu amor

O refrão de fato é o ápice. Tanto "me atraiu" da versão brasileira, quanto o "me pôs de joelhos" do original apontam para a ação monergista [2] da Trindade na regeneração. Sem palavras, nos aproximamos da cruz.

Entretanto, a segunda parte da canção, julgo eu, perdeu um pouco de detalhe quando foi traduzida. No inglês, há a menção do nome de Cristo, ausente na tradução, e evidencia a ira do Senhor que fomos livres, ao invés de apenas falar em condenação. Vejamos:

Que um dom inestimável, vida desmerecida que me foi dada / Pelo Cristo crucificado
Você me chamou para fora da morte / Você me chamou para a vida / E eu estava sob a Sua ira / Agora, através da cruz estou reconciliado

Já a ponte para voltar ao refrão, nem se fala. Antes de conhecer a versão americana, eu desconfiava que ela estava lá apenas por um pedido de gravadora para enquadrar o hino nos moldes do pop (as gravadoras adoram estragar músicas) porque ele não me soava pertencente à poesia de todo o restante da canção. E eu estava certo. A versão em inglês é muito mais profunda:

No temor da cruz devo confessar / Quão maravilhoso Seu amor redentor é / E como é grande a Sua fidelidade

Aqui há mais do que uma declaração de alguém impressionado. Há um temor [3] que ordena nossas almas a confessar, proclamar o fiel amor do nosso Deus. Essa é a conclusão da música. É a resposta que o autor tem depois de olhar toda a obra da Salvação, todo o cuidado do plano de Deus para nós. Há muito mais pra ser dito aqui, mas tudo podemos resumir muito ao confessar: grande é a Tua fidelidade, Senhor.



Observações

[1] Toda a letra, em português e em inglês, tirada do site Vagalume;
[2] O monergismo é a doutrina que diz que a Trindade atua autonomamente no ato de Salvação, sem o sinergismo com o ser humano;
[3] No site há "reverência", mas a tradução mais correta para a expressão "awe" é "temor";

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